Existe um portão secreto que une a casa dos meus pais à casa da minha avó. Ele sempre existiu. sempre foi o mesmo. Passou por algumas pinturas mas sua estrutura é original, desde que me conheço por gente.
O tal portão fica no final do muro que une as duas casas, longe da vista de quem olha as casas da rua. Acessível somente aos moradores das casas. Uma espécie de portão da intimidade.
Minha avó, quase aos 90 anos, mas com saúde de ferro, atravessa o portão infinitas vezes ao dia, apressada com tarefas às quais só ela dá urgência e que a mantém viva.
Existe um pequeno degrau no portão, um obstáculo para quem o atravessa. A passagem é estreita e o portão, hoje em dia é branco.
Do lado da casa dos meus pais, o tal portão é a única coisa que dá sentido a um corredor que, depois de várias reformas pelas quais passou a casa, ficou totalmente sem utilidade e também sem saída (nem entrada). Hoje em dia, guardam-se grandes bacias de alumínio nesse corredor.
Do lado da casa da minha avó, ainda o mesmo chão de caquinhos vermelhos, salpicados de algumas poucas pecinhas amarelas. Uma tampa de alguma caixa de água, feita de concreto, que quando a gente pisa faz barulho. É a campainha do portãozinho. A gente sempre sabe quando alguém vai atravessá-lo quando pisa na tal tampa. São os sons secretos das casas.
Quando meu avô morreu, minha avó desesperada correu até o portão para chamar pela ajuda dos meus pais, mas não pôde atravessá-lo, ficou caída no degrau. Como se, atravessar o portão, fosse abandonar pra sempre o amor de uma vida toda.
Naquela madrugada atravessamos o portão inúmeras vezes...carregando a tristeza de lá pra cá...de cá pra lá.
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