domingo, 15 de abril de 2012

"A gente envelhece assim, pedaço por pedaço. E então, de repente, sua alma envelhece: mesmo sendo o corpo efêmero e mortal, a alma ainda é movida por desejos e recordações, ainda procura alegria. E quanto também desaparece esse desejo de alegria, só restam as recordações e a inutilidade de todas as coisas; nesse estágio, estamos irremediavelmente velhos. Um dia você acorda e esfrega os olhos e não sabe mais por que acordou. Já sabe exatamente o que o dia apresentará a ses olhos: a primavera ou o inverno, os cenários habituais, as condições atmosféricas, a ordem dos fatos. Nada de surpreendente pode acontecer: não o surpreendem nem sequer os fatos inesperados, insólitos ou horripilantes, porque você conhece todas as probabilidades, já previu tudo e não espera mais nada, nem para o bem nem para o mal...e esta é a verdadeira velhice." (Sandor Marai - As brasas)

segunda-feira, 9 de abril de 2012

"a minha mãe deixava de falar comigo e com o aldegundes, porque lhe saíam coisas de mulher boca fora, e barafustar, como fazia, era encher os ouvidos dos homens com ignorâncias perigosas. uma mulher é ser de pouca fala, como se quer, parideira e calada, explicava o meu pai, ajeitada nos atributos, procriadora, cuidadosa com as crianças e calada para não estragar os filhos com os seus erros."
(valter hugo mãe em "remorso de baltazar serapião")

quarta-feira, 4 de abril de 2012

A morte de Ivan Ilitch...e de todos nós!

"O exemplo do silogismo que aprendera no compêncio de lógica de Kiesewetter - Caio é um homem, os homens são mortais, logo Caio é mortal - sempre lhe parecera exato em relação a Caio, jamais em relação a ele. Que Caio, o homem abstrato, fosse mortal, era perfeitamente certo; ele, porém, não era Caio, não era um homem abstrato, era um ser completa e absolutamente distinto de tosod os demais. Ele fora o pequeno Vania, com sua mamãe e seu papai, com Mitia e Vológida, com os brinquedos, o cocheiro, a ama depois com Katienka e com todas as alegrias, tristezas e entusiasmos da infância, da adolescência e da mocidade. Porventura conheceu Caio o cheiro da pequena bola de couro listrado de que Vania tanto gostava? Por acaso Caio beijava a mão da mãe como Vania? Era para Caio que a seda do vestida da mãe fazia aquele frufru? Fora Caio quem protestara, na escola, por causa dos pastéis? Tinha Caio amado como Vania? Seria Caio capaz de presidir, como ele, uma audiência?
Caio é de fato mortal e, portanto, é justo que morra, mas quanto a mim, o pequeno Vania, Ivan Ilitch, com todos os meus sentimentos e minhas idéias, o caso é inteiramente outro. É impossível que eu tenha de morrer. Seria demasiado horrível."